Categoria 3 | Manoela Cavalinho
Há pouco mais de um ano um decreto presidencial encerrou as atividades do Grupo de Trabalho Perus e do Araguaia, inviabilizando a pesquisa e identificação das ossadas dos desaparecidos políticos durante a Ditadura Militar. Esse enredo encontra eco também no Paraná.
Dentro do Parque do Iguaçu jazem Vitor, José, Joel, Daniel e Onofre, desaparecidos em 1974. Membros da VRP (Vanguarda Revolucionária Popular) estavam exilados na Argentina quando foram atraídos para o noroeste do Paraná e assassinados em local próximo à Estrada do Colono. Várias expedições tentaram encontrar os corpos, sem sucesso. Anos depois, a Estrada do Colono foi interditada exatamente nesse trecho (entre Serranópolis do Iguaçu e Capanema). Hoje restam-lhes poucos pedaços que não foram invadidos pela mata. A passagem do tempo, a falta de interesse político na identificação dos desaparecidos e a condição da estrada tangenciam a possibilidade de identificação.
Na instalação ‘Vitor, José, Joel, Daniel e Onofre’ vou até a antiga Estrada do Colono, via Serranópolis do Iguaçu e, ao chegar no final da estrada e início da mata identifico as árvores pelas quais eu vou passando com uma peça de cerâmica em formato de osso (fêmur, tíbia, vértebra, omoplata),em cor branca e tamanho próximo do natural, modelado pela artista. Amarro trinta dessas peças com fio de cobre sobre a árvore, cada uma delas um pouco mais para dentro da mata. Sigo adiante até o osso cerâmico de número 30. Esses trinta ossos cerâmicos amarrados funcionam enquanto guiar nesse curto trecho que parte da estrada em direção à mata. O caminho também indica o ponto de retorno para esses desaparecidos políticos. Caso isso nunca venha a ocorrer, com o passar do tempo o fio de cobre que sustenta o osso amarrado na árvore também se tornará branco (pelo processo de oxidação), atuando à maneira daquele osso criar raiz pela árvore e, quem sabe, ser envolvido por ela.
Manoela Cavalinho.
Título | Onofre, José, Enrique, Joel, Daniel e Víctor, 2021 |
Artista | Manoela Cavalinho |
Técnica | Intervenção urbana; Instalação |
Duração/ Tamanho | Dimensões variáveis |
Aquisição | Prêmio 67o Salão Paranaense |
No de Registro |
Manoela Cavalinho
nasceu em Porto Alegre (RS), em 1981.Trabalha com instalações que abordam aspectos singulares da memória pessoal, tecendo entrecruzamentos com a memória coletiva. Geralmente o ponto de partida dos seus trabalhos são imagens inconscientes nas quais a artista se detém para explorar seus desdobramentos. Durante a pesquisa e a produção valoriza o estudo formal e de materiais e incorpora as coincidências que surgem ao longo do processo. Imersão e exaustão estão presentes durante as montagens, numa espécie de “ritual” desprovido de fé. Além das instalações, trabalha geralmente com cerâmica e fotografia, além de se considerar uma pintora bissexta.