Lá onde o mar separa, lá onde as imagens conectam

 

Lá onde o mar separa, lá onde as imagens conectam

 

 

DE 02 A 17 DE SETEMBRO

SALA 09 - MAC NO MON

 

Lá onde o mar separa, lá onde as imagens conectam

Esta exposição explora as migrações não como simples passagens de um ponto a outro, mas como experiências de inquietação, de resistência, de memória em movimento. Por meio de uma constelação de obras em vídeo com abordagens heterogêneas, ela traça uma cartografia fragmentada, atravessada por heranças coloniais, tensões geográficas, deslizes de linguagem e imaginários do exílio. Do Magrebe à Córsega, da Martinica ao Brasil, até a Polinésia, as imagens deslocam os relatos dominantes, abrem fissuras e fazem emergir outras relações com os lugares e a história.

A areia está imóvel. O olhar mal percebe o que se move. Quase nada: alguns capins, uma curva quase imperceptível. São gestos discretos que, já, contam uma história mais ampla — a da tensão entre aparecimento e apagamento, como sugere Ismaïl Bahri. Em seguida vem a palavra, colocada como uma presença. Uma mulher está ali, diante da câmera. Ela encarna uma memória oral, uma figura de transmissão, uma sobrevivência silenciosa. Yto Barrada lhe dá um rosto. Por meio da lembrança musical do raï, entre Argel e Marselha, Katia Kameli faz ouvir vozes que cantam tanto o afastamento quanto o pertencimento. Então surge o mar — mas não como cenário. Na obra de Ange Leccia, ele se torna matéria visual pura, sucessão de ondas hipnóticas, quase abstratas. Nem margem, nem travessia: uma repetição líquida, infinita, que absorve as narrativas sem jamais encerrá-las.

A história colonial ressurge, então, carregada pela figura de Zumbi dos Palmares: líder negro de um território livre no Brasil, assassinado em 1695, que hoje se tornou símbolo da consciência afro-brasileira. Julien Creuzet o transforma em um corpo-mundo, ao mesmo tempo fragmentado, poético e político. Por fim, Natasha Lesueur nos leva a uma Polinésia irreal, onde coqueiros estão imóveis sob uma luz saturada. A paisagem torna-se um cenário irrealista, trabalhando diretamente sobre a iconografia colonial para extrair dela novas tensões.

Cada uma dessas obras não trata diretamente da migração, mas é a relação entre elas, por vezes o confronto, que produz sentido. Juntas, elas propõem uma maneira de pensar os deslocamentos como derivas, contranarrativas, desvios contínuos, experiências emancipatórias. Desenham um espaço comum onde a história não é fechada nem linear, mas feita de camadas, de vozes, de gestos, de paisagens marcadas por ausências. Compõem um arquipélago de imagens — lá onde o mar, tantas vezes, separa; lá onde as imagens, obstinadamente, conectam.

Là où la mer sépare, là où les images relient

Cette exposition explore les migrations non comme simples passages d’un point à un autre, mais comme expériences du trouble, de la résistance, de la mémoire en mouvement. À travers une constellation d’œuvres vidéo aux approches hétérogènes, elle dessine une cartographie fragmentée, traversée par les héritages coloniaux, les tensions géographiques, les écarts de langage et les imaginaires de l’exil. Du Maghreb à la Corse, de la Martinique au Brésil, jusqu’à la Polynésie, les images déplacent les récits dominants, ouvrent des failles, font surgir d’autres relations aux lieux et à l’histoire.

Le sable est immobile. L’œil peine à percevoir ce qui se déplace. Presque rien : quelques herbes, une courbe à peine gravée. Ce sont des gestes discrets qui, déjà, racontent une histoire plus vaste - celle de la tension entre apparition et effacement, telle que la suggère Ismaïl Bahri. Puis vient la parole, posée comme une présence. Une femme se tient là, face à la caméra. Elle incarne une mémoire orale, une figure de transmission, une survivance silencieuse. Yto Barrada lui donne visage. À travers le souvenir musical du raï, entre Alger et Marseille, Katia Kameli fait alors entendre les voix qui chantent l’éloignement autant que l’appartenance. Puis surgit la mer - mais non comme décor. Dans l’œuvre d’Ange Leccia, elle devient matière visuelle pure, succession de vagues hypnotiques, presque abstraites. Ni rivage, ni traversée : une répétition liquide, infinie, qui absorbe les récits sans jamais les clore.

L’histoire coloniale ressurgit ensuite, portée par la figure de Zumbi dos Palmares : chef noir d’un territoire libre brésilien, assassiné en 1695, devenu aujourd’hui symbole de la conscience afro-brésilienne. Julien Creuzet en fait un corps-monde, éclaté, poétique et politique à la fois. Enfin, Natasha Lesueur nous emmène dans une Polynésie irréelle, où les palmiers sont figés dans une lumière saturée. Le paysage devient décor déréalisé, travaillant à même l’imagerie coloniale pour en extraire des tensions nouvelles.

Chacune de ces œuvres ne traite pas directement de la migration, mais c’est leur mise en relation, leur confrontation parfois, qui produit du sens. Ensemble, elles proposent une manière de penser les déplacements comme des dérives, des contre-récits, des écarts continuels, des expériences émancipatrices. Elles dessinent un espace commun où l’histoire n’est ni close ni linéaire, mais faite de strates, de voix, de gestes, de paysages troués. Elles composent un archipel d’images - là où la mer, trop souvent, sépare, là où les images, obstinément, relient.

 

Ismaïl Bahri
Yto Barrada
Julien Creuzet
Katia Kameli
Ange Leccia
Natacha Lesueur